Patagônia Argentina - Parque Nacional Los Glaciares - Fitz Roy - El Chalten

Por DD


Fitz Roy é um dos montes que fazem parte da cadeia de montanhas que estão dentro do Parque Nacional Los Glaciares e estão situados na divisa entre o Chile e Argentina. El Chalten inclusive é a cidade mais jovem da Argentina e foi criada justamente nos anos 80 para proteger os limites internacionais entre os países. Bom, a ditadura se foi e El Chalten se transformou na capital Nacional de Trekking.
Foi nessa cidade (vilarejo) de no máximo 500 habitantes e totalmente voltada para o turismo de aventura que os "malucos" resolveram passar o início do ano.

Mapa da região para facilitar o acompanhamento do relato (contorno laranja para as trilhas realizadas)

Bom, são várias trilhas a serem percorridas e escolhidas, desde as mais fáceis que nem podem ser chamadas de trekking até as mais empolgantes (assim determinarei). Inclusive ha oportunidade, se agendado com antecedência, se caminhar sobre glaciares com auxílio (obrigatório) de guias. Mas não tivemos esse tempo disponível e de novo vai ficar para uma próxima. Se bem que cravei minha bota num pedaço do mundo branco e já fiquei contente.


El Chalten e a cadeia ao fundo


Como chegar:

Vôo até Buenos Aires e de lá outro para El Calafat. Depois segue-se em ônibus por umas 4 horas até El Chalten. Recomendo fazer o que sempre fazemos e que desta vez falhei, ou seja, compre as passagens com antecedência de uns 2 meses e tenha a certeza de que tudo vai funcionar muito bem. Bom a falha de comprar tudo de última hora causou grandes atrasos por falta de vôo.....e etc. Resumindo, chegamos as 23hs num frio de doer os dentes sem reserva em nenhuma hospedagem e com a cidade cheia de gringos e quartos lotados...

Começo da trilha ao Cerro Torre

TRILHA LAGUNA TORRE

Depois de umas compras matinais para o café da manhã em um albergue e para as provisões de acampamento dos dias que seguiriam, deixei El Chalten no meio da manhã sentido Acampamento De Agostini. A trilha se parece muito com a que fizemos em Torres del Paine há dois anos. Ou seja, vegetação baixa rodeada por montanhas rochosas altíssimas com o cume coberto de gelo, combinadas com aparições esporádicas de campos de árvores de média estatura, pouca folhagem e troncos pretos parecendo queimados. ( O que não se parece em nada é a infra-estrutura apresentada entre os atrativos acima que comentarei mais tarde). Resumindo, a paisagem é linda e de tirar o fôlego, seja pela beleza quanto pelo frio intenso causado pelo vento incessante que não dá trégua.


Esta caminhada leva por volta de 3 hs e tem um pequeno desnível de 200 metros. É um caminho muito usual de turistas (bate e volta) e que em seu percurso visualiza-se o Cerro Torre quase que constantemente. Há água em abundancia pelo caminho já que é verão e o degelo está em alta. Percebo muitos casais e pessoas de mais idade fazendo o caminho, provando que bom gosto não cria barreiras entre sexo ou idade. Fantástico.



Cheguei ao acampamento e logo fui armando barraca e largando todo o peso para aproveitar o restante da trilha até a laguna Torre. O dia estava lindo, pouco vento(nada comum por aqui)e com um sol acanhado para esquentar. A visão das torres espelhando na laguna era deslumbrante e eu e mais uma centena de pessoas estavam ali aproveitando o momento.
Como a foto mostra acima, eu estava perto de fincar meus pés no gelo. Pura ilusão, circundei a Laguna por mais de uma hora (ida) por uma caminho de muitas pedras e cheguei numa placa proibindo o acesso. Confesso que não resisti e contornei a placa até avistar um penhasco gigantesco que terminava dentro do glaciar e consequentemente laguna abaixo. Achei arriscado demais continuar com o risco de cair na laguna congelante e... fiquei ali apreciando a paisagem e pensando quanto tempo mais poderíamos contemplar aquele momento...

quase no Glaciar Cerro

Bom, a tarde se foi e voltei para o "aconchego da barraca" bastante cansado pelo esforço que havia feito e descubro que havia deixado no albergue o combustível para meu fogareiro. Nossa que falta de atenção tremenda acrescentada de burrice que não poderia ter acontecido jamais com alguém metódico (ou chato) que passa e repassa o material algumas vezes.
Então, agora era torcer por alguma boa alma me vender uma parte do combustível já que era terminantemente proibido fazer fogo dentro do parque, inclusive já tinha visto um guarda-parque circundar a área.
Logo na primeira barraca que vejo um casal preparando uma "bóia" e disparo logo em espanhol o pedido. O cara muito atencioso responde em espanhol que era benzina seu combustível e queria saber se funcionaria no meu fogareiro. Soltei um "putz" sem querer e o cara logo começou a rir perguntando se eu era brasileiro.
Hehehe, rimos um bom tempo quando soube que o cara além de brasileiro morava ha poucos quilômetros da minha casa. Que coincidência absurda, só sei que o Eduardo e sua namorada emprestaram o seu fogareiro e graças a eles fiz uma macarronada com salaminho e não tive que comer barra de cereal a noite inteira.

Bom, acampávamos abaixo de um glaciar e meu saco de dormir suportava (1grau.) Passei um frio absurdo durante a noite inteira e acordava de meia em meia hora para mudar de posição para tentar me esquentar. Ou seja, fez bem abaixo de zero nesta noite e serei eternamente grato ao casal de brasileiros que me emprestaram o fogareiro. Se não fosse a refeição quente e cheia de carboidratos e proteínas que jantei, o frio que sentiria seria muito mais intenso.
Pelas 6 de manhã, com um vento intenso resolvi deixar o "aconchego" já que o frio seria muito menos castigante fora caminhando do que ficar ali parado. A idéia era ficar defronte a laguna Torre esperando o sol nascer e por consequência mudar o tom natural do Cerro para laranja. Bom, a espera foi em vão e ao contrário do dia anterior o dia estava completamente nublado, e essa uma hora de espera parado recebendo o vento congelante do glaciar no peito não estava me parecendo uma boa idéia. Parti rumo ao acampamento Poincenot.

TRILHA LAGUNA MADRE E HIJA

O caminho do acampamento Agostini para o acampamento Poincenot é bem duro, ao contrário do dia anterior, a subida é bem forte. Ou seja, você está num vale e tem que passar para o outro vale ao lado. Comecei o trajeto bem cedo, o que me deu bastante gás e tempo para continuar o restante, e a vista compensou bastante.
Passei pelas Lagunas Hija e Madre (encantadoras) até chegar ao poincenot.
É uma trilha não muito usada, pelo que percebi a maioria dos turistas não acostumados a acampamentos faziam as trilhas em bate e volta, ou seja, saiam cedo dos seus hotéis para iniciar as trilhas e voltavam ao final da tarde. Então passei por poucas pessoas nesse trecho, porém o caminho é lindo e meu objetivo mesmo era caminhar só sem contato humano o maior tempo possível.



Cheguei ao acampamento Poincenot por volta das 10 hs e já fui logo armando acampamento para novamente me livrar de todo o peso possível para encarar a subida a seguir que prometia ser forte segundo o mapa, e sinceramente não precisava muito de informações para perceber que estávamos acampados num vale abaixo do Fitz Roy, que tem( "somente" 3405 metros) e que teríamos que subir aquele penhasco todo.


TRILHA LAGUNA DE LOS TRES
Fato: foi o caminho mais íngrime que já fiz na vida, (e olha que já fiz muitos) todo feito sobre deslizamentos de pedra e numa verticalizada impressionante. Porém as pessoas se programam pra encarar o caminho por várias horas e sem nenhuma dúvida, vale o esforço. A paisagem é simplesmente....................(entenderam). A vista do topo das montanhas desnudas, interagindo com o gelo caindo montanha abaixo até encontrar a laguna é fenomenal. Vale todo e qualquer sacrifício. Novamente bastante contraste físico pelo caminho, ultrapassei bastante gente e descobri na volta que nenhum havia desistido, apenas estavam fazendo no seu ritmo e que a motivação faria o tempo de chegada.


Falando em volta, após sentir flocos de neve caírem sobre meu anorak resolvi descer. O sacrifício da subida não chegou nem perto o parto da descida. Foi então que descobri que a descida iria me consumir muito mais, não energia mais sim pelos calos e dores que comecei a sentir na solas dos pés que estavam sendo ocasionadas pela forte verticalidade da descida e que não me eram costumeiras. Lembram da neve? Bom, lembrei da noite fria que passei no outro lado do vale e resolvi que sem uma boa alimentação quente não teria uma noite feliz, pois o frio me parecia infernal já comigo aquecido pela descida, imagine então...........
No começo do post prometi comparar Torres del Paine com Fitz Roy em termos de infra-estrutura, lembram? Simplesmente não existe comparação. Em Fitz Roy não existe um camping descente ao ponto de fornecer água, cozinha e nem mesmo banheiro. Ou seja, todos os campings não possuem água encanada, conseqüentemente banheiros. Enquanto que no Chile, em cada base que você acampe, você tinha disponível chuveiros, banheiros, lenha, etc.
Então pensei comigo, mais uma noite passando frio extremo e sem poder ter o mínimo de higiene? Claro que não , vamos detonar trilha de volta a El Chalten e fazer o restante no bate e volta como os demais.

TRILHA LAGUNA CAPRI
Para o meu desespero o caminho era só de descidas até a vila, rssrrrsrsrsrs. O que para muitos seria o paraíso, para mim se tornou um martírio. Bom, o que importa é que cheguei bem tarde a cidade mas que valeu a pena. Me hospedei novamente no albergue da primeira noite e cai logo num banho longo e quente. Eita, como é bom passar dificuldades para dar o devido valor as pequenas coisas. Depois do banho, cansado ao extremo não pensei duas vezes. Corri átras de " um lugar com um som legal, com gente legal e cerveja barata" .........
Depois da cerveja e o jantar dos deuses, escrevi "estas mal traçados linhas" e cai feito um zumbi na cama. Pelas 2 da manhã comecei a ter pesadelos com a banda Maná tocando ao meu lado ao som de 1 violão, 19 vozes e uns 3 bateristas de mesa. Inflamados os integrantes tocaram até as 3 de manhã com incessantes gritos de "toca Raul" em espanhol é claro. Bom, vou confessar com a música não era ruim, mas convenhamos que num hostel as 3 da manhã nunca tinha visto.
Já que não conseguia dormir mesmo, levantei para ir ao banheiro e descobri que o público era maior do que eu pensava. Então passei no meio da platéia e banda para chegar ao banheiro com cara de sono , é óbvio. Mas não disse uma palavra nem em português nem espanhol. Acho que meu silêncio misturado com a cara de sono sensibilizou a banda que dispersou tão rápido quanto se formou. O que me impressionou mais foi o fato de eu só ouvir a porta da frente do albergue abrir e fechar. No outro dia percebi que a galera toda estava acampada ao lado do albergue e estavam todos aproveitando somente a calefação do hotel. hehehehehe, no fundo estou rindo até hoje.




TRILHA CHORRILLO DEL SALTO

Agora era fazer as trilhas com mais calma. Resolvi de cara alugar uma bike e partir para um sendero diferente. Acertei em cheio, peguei a ruta 23 de rípio compartilhada por uns carros que vez por outra me cruzavam até chegar a um desvio proposital que me rendeu uma excelente vista do Fitz Roy. Continuando no caminho chego no Chorrillo del Salto, uma bela queda formada pelo degelo que me surpreendeu pela sua beleza e força da queda. Como tinha alugado a bicicleta por 4 horas, resolvi esticar a pedalada por mais alguns minutos até alcançar 2 horas para poder voltar. Resultado, o vento era tão forte que levantava o pneu dianteiro e era impossível continuar. Voltei rindo por um bom tempo, já que seguir adiante era penoso, porém voltar era prazeroso. Como o vento agora estava a meu favor, me trouxe por longos 2 ou sei lá quantos minutos sem precisar pedalar, somente precisava equilibrar a bike. Resultado, cheguei muito antes do horário previsto e me sobrou tempo para mais uma vez aproveitar a cevada argentina.




Chorrillho del Salto



TRILHA LOS CONDORES E LOS ÁGUILAS

Bom, este seria meu último dia na cidade e resolvi passear pelo povoado pela manhã e fazer uma trilha moderada no período da tarde somente para não perder o costume. Esta trilha é tão simples que nem pode-se chamar de trekking o meu percurso. Ela simplesmente sai do centro e contorna uma montanha atá chegar a seu topo. Um lado da montanha Los condores e mais adiante Los aguilas. Resumindo, ela lhe dá uma boa visão da cidade de um lado, e a visão da Bahia Túnel do outro. Coisa para turista ver, mais se tiver tempo disponível consegue-se boas imagens.






vista da Bahia Túnel da trilha Los Aguilas






vista da trilha Los Condores para El Chalten



Foi um outro mundo mesmo escontrar essa delícia.
E depois de tudo isso não deixem de "interagir" com a cultura local e tomem uma cerveja artesanal argentina ou um bom vinho malbec.

Abraços

DD